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terça-feira, 29 de maio de 2012

O Simbolismo do Centro



''O Centro é, eminentemente, a região do sagrado, a região da realidade absoluta. Semelhantemente, todos os outros símbolos da realidade absoluta (árvores da vida e imortalidade, fontes da juventude, etc) estão também situados num Centro. O caminho que leva ao Centro é um 'caminho difícil ' e isto acontece em todos níveis da realidade: convoluções difíceis de um templo (como em Borobdur); peregrinação a locais sagrados (Meca, Hardwar, Jerusalém); perigosas viagens das expedições heróicas em busca do Velo de Ouro, as Maçãs de Ouro, a Planta da Vida; andar às voltas em labirintos; dificuldades do que demanda pelo caminho do eu, até ao centro do seu ser e por aí em diante. O caminho é árduo, cheio de perigos, porque é, de facto, um rito da passagem do profano para o sagrado, do efémero e ilusório para a realidade e eternidade, da morte para a vida, do homem para a divindade. Alcançar o Centro equivale a uma consagração, uma inicição; a existência profana e ilusória de ontem dá lugar a uma nova, a uma vida que é real, duradoura e efectiva. ''

Mircea Eliade, O Mito do eterno retorno

sábado, 26 de maio de 2012

Três histórias Zen



O verdadeiro caminho 


O mestre Zen Iquiú visitou Ninacava, pouco antes de ele abandonar esta vida.
- Queres que te conduza?- perguntou Iquiú.
Ninacava replicou:
-Cheguei aqui sozinho e parto sozinho. Que ajuda poderias dar-me?
Iquiú respondeu:
- Se pensas que realmente que chegas e partes, essa é a tua ilusão. Deixa que te mostre o caminho onde não há nem chegar nem partir.
  Com estas palavras, Iquiú revelara tão claramente o caminho, que Ninacava sorriu e deixou este mundo.


O suor de Cazane


Cazane foi chamado a oficiar no funeral de um senhor da sua província.
Porque, até aí, nunca privara com senhores e nobres, ficou nervoso. Quando a cerimónia começou, Cazane estava a suar.
Mais tarde, já de regresso, reuniu os seus discípulos. Confessou que ainda não estava preparado para ser professor, dado que lhe faltava uma atitude no mundo dos famosos idêntica à que tinha na reclusão do templo. Depois, Cazane demitiu-se e fez-se pupilo de um outro mestre. Só oito anos mais tarde, já iluminado, voltou a ensinar os seus antigos pupilos.


Sem apego ao pó


Zenguetsu, um mestre chinês da Dinastia Tang, escreveu, para os seus pupilos, os seguintes conselhos:
Viver no mundo e, no entanto, não criar apego ao pó do mundo é o caminho de um verdadeiro estudante de Zen.
Ao testemunhar a boa acção de outrem, encoraja-te a seguir-lhe o exemplo. Ao saber do erro de outrem, diz a ti próprio que não o imites.
Ainda que estejas só num quarto às escuras, age como se estivesses perante um hóspede ilustre. Exprime os teus sentimentos, mas não te tornes mais expressivo que a tua verdadeira natureza.
A pobreza é o teu tesouro. Nunca a troques por uma vida de lazer.
Uma pessoa pode parecer um louco e no entanto não o ser. Poderá estar apenas a guardar cuidadosamente a sua sensatez.
As virtudes são o fruto da autodisciplina e não caem do céu por si próprias como a chuva ou a neve.
A modéstia é o alicerce de todas as virtudes.
Deixa que os teus vizinhos te descubram, antes de te apresentares a eles.
Um coração nobre nunca se força a exprimir-se. As suas palavras são como gemas raras, raramente expostas e de grande valor.

In ' 101 Histórias Zen ', de Nyogen Senzaki e Paul Reps



sexta-feira, 25 de maio de 2012

Flores de Maio

Flores de Maio


A Primavera era nossa
Quando te dei flores em Maio
Cresciam junto ao penhasco
O abismo das nossas almas

A chama que se apaga
É a mesma que um dia se acendeu
O tempo que tudo corrói
É o mesmo que tudo faz crescer

As flores murcham sobre a mesa
Não há água que as rejuvenesça
A flecha que foi lançada
Jamais pode voltar atrás.

N.Afonso, 10.05.2012

domingo, 13 de maio de 2012

Caminho do calvário

Caminho do calvário


Foges de ti próprio
És o Caim que matou Abel
Rogas pragas aos inimigos
Desconhecidos, sem nome

E de manhã quando te levantas
Encostas-te ao teu ego indolente
Semeias ventos entre os que passam
Depois acordas na tempestade

Carregas aos ombros
A cruz do teu destino
Espezinhas a lealdade
Ignoras a coragem

Desprezas a honra
Lisonjeias a traição
Chegou a hora!
Morrerás em vão.


N. Afonso, 6.05.2012

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Evola- Aquilo que conta




'' As coisas chegaram a tal ponto que hoje nos perguntamos quem será capaz de assumir o mundo moderrno não em qualquer um dos seus aspectos particulares - «tecnocracia», «sociedade de consumo», etc.-, mas sim em bloco, até apreender o seu significado último. Só este poderia ser o princípio.
Mas para isso é necessário sair do círculo de atracção. É necessário saber conceber o outro - conseguir criar novos olhos e novos ouvidos para coisas que o afastamento tornou invisíveis e mudas. Só remontando aos significados e às visões em vigor antes que se estabelecessem as causas da civilização presente, é possível ter um ponto absoluto de referência, a chave para a compreensão efectiva de todos os desvios modernos - e ao mesmo tempo achar o baluarte sólido, a linha de resistência inviolável para aqueles a quem, apesar de tudo, será concedido o manterem-se erguidos. E hoje em dia o que conta - precisa e exclusivamente- é o trabalho de quem souber conservar-se dentro das linhas de superioridade: firme nos princípios; inacessível a qualquer concessão; indiferente perante as exaltações,as convulsões, as superstições e as prostituições a cujo ritmo dançam as gerações modernas. Só conta o silencioso manter-se firme de poucos, cuja presença impassível de «convidados de pedra» sirva para criar novas relações, novas distâncias e novos valores; para construir um pólo que, se obviamente não impedirá este mundo de desviados e exaltados de ser o que é, contudo será válido para transmitir a alguém a sensação da verdade - sensação essa que talvez até poderá ser o princípio de alguma crise libertadora. ''

Julius Evola ''Revolta contra o mundo moderno'', Publicações D.Quixote, 1989

quinta-feira, 3 de maio de 2012

A casa velha junto ao lago

A casa velha junto ao lago


Numa casa velha junto ao lago
Vive um homem solitário
Lembra os camaradas de outrora
Era a coragem a sua pátria

Na casa isolada de madeira
Uma arma gasta e uma cana de pesca
São agora as suas companheiras
Ele olha em frente, sem remorsos
O dia avança como tantos outros

O sol espreita entre os pinheiros
Uma águia paira nas alturas
Cantam aves nos altos ramos
O homem escuta e observa

A guerra- distante mas sempre perto
A vida- uma arco-íris de memórias
A morte- a outra margem do rio
A mente- apaziguada perante a dor
E a lua reflectida sobre as águas

Os irmãos caídos, nunca esquecidos
Em batalhas idas não perdidas.

N. Afonso, 6.04.2012

terça-feira, 1 de maio de 2012

Decadência e ruína do império Freudiano(excerto)


                                                                Hans J. Eysenck


Hans Jurgen Eysenck, ' Decadência e ruína do império Freudiano' ( Tradução minha a partir do Castelhano)

'' Quando eu era estudante, a vida intelectual europeia e americana estava dominada por três grandes figuras: Einstein na Física; Karl Marx na Economia e Sociologia e Sigmund Freud na Psicologia.
   Dos três, foi Freud quem pior sofreu a prova do tempo. Mais que nociva, a sua doutrina parece hoje desprovida de carácter científico, no sentido de que não permite estabelecer previsões controláveis. Assim o notaram Karl Popper e outros epistemólogos: se determinamos de que modo uma teoria é desmentida pela experiência, quer dizer que, cientificamente, essa teoria não tem nada para dizer. Mas ainda, os métodos de tratamento que Freud retira das suas ideias são hoje considerados como quase ineficazes. Entre os especialistas a sua fama caiu muito, ainda que não se possa contestar como profeta da 'mudança social'.

O Mito da psicanálise

Freud pensou que a psicanálise encontraria uma virulenta resistência na opinião pública, mas assim não foi. A sua doutrina foi aceite com mais facilidade do que nenhuma outra ideia revolucionária, Em psiquiatria o seu método teve, até hoje, uma importância considerável, sobretudo nos Estados Unidos. Deste modo, a psicanálise é o único método de psicologia conhecido por escritores, jornalistas, cineastas, professores, filósofos, e até o homem da rua. Para muita gente, psicanálise é sinónimo de psicologia. Deparamo-nos assim com uma situação curiosa, no sentido de que a psicanálise é plenamente aceite pelos profanos, enquanto que é rejeitada pelos que nesse domínio possuem conhecimentos sérios.

A conclusão de tal estado de coisas é que a psicanálise é um mito, quer dizer, um conjunto de crenças semi--religiosas propagadas por indivíduos que se devem considerar não como investigadores mas como profetas ou iluminados.

Falta de rigor

Freud, por seu lado, estava mais interessado na psicanálise como filosofia geral que pelos seus conhecimentos respeitantes à pessoa e à possibilidade de conhecer o seu «inconsciente«. Dava muita pouca importância aos aspectos curativos da sua doutrina, e no final da sua vida, tornou-se algo céptico em relação às «curas» que obrava. Mas os seus discípulos não estão nessa via: eles persistem em afirmar que a psicanálise é, não só o melhor método de tratamento, mas o único que garante uma cura verdadeira.

Na verdade, a única coisa que costumam fazer os psicanalistas é dar a conhecer exemplos isolados e individuais (obviamente, sempre curas) e depois de utilizarem tais exemplos retiram conclusões de alcance geral. Este procedimento é o exempo clássico do sofisma ' post hoc, ergo propter hoc '. O facto de que um doente chamado John Doe, que sofre uma fobia, comece a sentir melhoria depois de quatro anos de tratamento psicanalítico, não prova de modo nenhum que John Doe deva a sua melhoria à psicanálise e ainda menos que essa fobia se cure com o tratamento dispensado.

Se querem provar a eficácia dos seus métodos, os psicanalistas deveriam ser mais rigorosos, porque se os pacientes tratados por eles não curam mais nem em maior número do que os tratados com outros métodos, os casos de cura não devem considerar-se. Mais ainda, os sujeitos tratados  pela psicanálise, demoram mais do que os ausentes do tratamento. Esta conclusão deduz-se da relação entre curas e sujeitos tratados.

Sessenta anos de atraso

Em 1952 publiquei os resultados das minhas observações: a psicanálise produz a menor cura de pessoas afectadas por neurose. produziu-se um avalancha de réplicas, críticas e rejeições, mas nem uma delas mencionava um caso verificável experimentalmente que demonstrasse o valor do tratamento psicanalítico.

Devemos voltar ao paradoxo invocado no início deste artigo: se os espíritos científicos e familiares com a psicologia rejeitam cada vez mais a teoria de Freud, poque são tão populares? A resposta é simples: Freud é, em si, um escritor e um dramaturgo. A sua doutrina tem o aspecto de um drama moralizante, com os seus heróis, os seus malvados e os seus monstros. Aqui o Ego, o Ele e o SuperEgo; além o censor, disposto a lutar com o inconsciente. Toda a trama, por outro lado, está centrada na sexualidade. Pode haver algo mais atraente? Mas nada tem que ver com a ciência. O próprio Freud disse: eu não sou por natureza cientista.

As teorias de Freud têm a vantagem de que todos podem brincar a psicanalisar os seus amigos. Como a prova cientìfica não intervém para nada, nunca haverá erro. Assim se populariza a psicanálise e nasce o paradoxo. Agora, já podem os sábios franzir o nariz ou os epistemólogos assinalar que as doutrinas de Freud carecem de fundamento, porque como o homem da rua não lê as publicações científicas ou as revistas de filosofia, nada disto surtirá qualquer efeito.

Mas outros métodos de tratamento mais rápidos e eficazes tendem hoje a substituir a psicanálise. A casa que Freud construíra foi demolida; alguns tijolos servirão sem súvida a futuros arquitectos, mas a nova construção não se parecerá em nada à de Freud.

Freud atrasou a psiquiatria mais de sessenta anos, ao não dar a menor importância à prova científica. Abandonando Freud, a psiquiatria poderá ser reconhecida como uma disciplina verdadeiramente científica.''

                                                                         Freud